Experiências, Perceções e Expectativas da Formação de Professores em Educação para os Media em Portugal
Experiencias, Percepciones y Expectativas de
la Formación del Profesorado en Educación para los Medios en Portugal
Experiences, Perceptions and Expectations of Teacher Training in Media
Education in Portugal
MANUEL
PINTO
SARA
PEREIRA
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Como citar este artículo:
Pinto, M. y Pereira, S. (2018). Experiências, Perceções e Expectativas da Formação de Professores em Educação para os Media em Portugal. Revista Interuniversitaria de Formación del Profesorado (RIFOP) 91(32.1). Versión post-print de 9 de marzo de 2018, recuperada el (día, mes, año) de https://aufop.blogspot.com.es/2018/03/rifop-91-321-experiencias-percecoes-e.html
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Datos de contacto:
Manuel Pinto: Universidade do Minho, Campus de
Gualtar, P-4710-057 Braga. Correo electrónico: mpinto@ics.uminho.pt
Sara Pereira: Universidade do Minho, Campus de Gualtar,
P-4710-057 Braga. Correo electrónico: sarapereira@ics.uminho.pt
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Recibido: 20/10/2017
Aceptado: 12/02/2018
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RESUMO
Nos últimos anos, muito tem sido dito
sobre a importância da formação de professores para promover a Educação para os
Media na escola. Vários documentos
apontaram a sua urgência e vários estudos (por exemplo, Bujokas, 2015; Taye
& Pérez-Tornero, 2012; UNESCO, 2011; Bazalgette, 2007) chamaram a atenção
para a necessidade de preparar os professores para enfrentar os desafios da era
digital, explorando os recursos e as oportunidades oferecidas pelos media e as redes digitais para
enriquecer o desenvolvimento pessoal e social. A integração curricular e a
formação de professores em Educação ou Literacia para os Media continuam a ser, no entanto, um grande desafio para o sistema
educativo. Em Portugal, o ‘Referencial de Educação para os Media para a Educação Pré-escolar, o Ensino Básico e o Ensino
Secundário’, aprovado pelo Ministério da Educação em abril de 2014, assume-se
como um marco para a implementação da Educação para os Media nas escolas. A partir desta iniciativa, bem como do Projecto
Europeu ‘e-MEL - e-Media Education Lab’, foram promovidos pelos autores deste
artigo, no ano letivo 2015-2016, quatro cursos de formação contínua de
professores em regime b-learning.
Este artigo pretende apresentar os resultados destes cursos de formação,
discutindo as expectativas dos professores, as competências desenvolvidas e os
obstáculos identificados pelos formandos. Tendo por base esta experiência de
formação, pretende-se também discutir os princípios metodológicos e as
modalidades de formação em Literacia para os Media. O artigo termina apontando a necessidade de uma política
educacional que valorize a formação de professores, o que poderá contribuir
para uma implementação consistente da Educação para os Media nas escolas.
PALAVRAS-CHAVE:
Educação para os Media, Professores, Formação, Currículo, B-learning
RESUMEN
En los últimos años, mucho se ha dicho
sobre la importancia de la formación de profesores para promover la Educación
para los medios en la escuela. Varios documentos han señalado su urgencia y
varios estudios (por ejemplo Bujokas, 2015; Taye & Pérez-Tornero, 2012;
UNESCO, 2011; Bazalgette, 2007) han llamado la atención sobre la necesidad de
preparar a los docentes para enfrentar los desafíos de la era digital,
explotando los recursos y oportunidades provistos por los medios y las redes de
comunicación para enriquecer el desarrollo personal y social. La integración
curricular y la formación de profesores en educación para los medios de
comunicación siguen siendo, sin embargo, un gran desafío para el sistema educativo.
En Portugal, el ‘Referencial de Educación para los Medios para la Educación
Preescolar, la Enseñanza Básica y la Enseñanza Secundaria’, aprobado por el
Ministerio de Educación en abril de 2014, puede representar un marco para la
implementación de la Educación para los Medios en las escuelas. A partir de
esta iniciativa, así como del proyecto europeo ‘e-MEL-e-Media Education Lab’,
fueron promovidos por los autores de este artículo, en el año escolar
2015-2016, cuatro cursos de formación continua de profesores en régimen
b-learning. Este artículo pretende presentar los resultados de estos cursos de
formación, discutiendo las expectativas, las competencias desarrolladas y los
obstáculos identificados por los profesores. Con base en esta experiencia de formación,
se pretende también discutir los principios metodológicos y las modalidades de
formación en Alfabetización en Medios. El artículo termina apuntando a la
necesidad de una política educativa que valorice la formación de profesores, lo
que podrá contribuir a una implementación consistente de la Educación para los
Medios en las escuelas.
PALABRAS CLAVE:
Educación para los Medios, Profesores, Formación, Currículum, B-learning
ABSTRACT
In recent years, much has been said about the importance of teacher
training in promoting media education at school. Several documents have
indicated its relevance and several studies (Bujokas, 2015, Taye &
Pérez-Tornero 2012, UNESCO 2011, Bazalgette 2007, for example) have drawn our
attention to the need to train teachers to face the challenges of the digital
age, exploiting the resources and opportunities provided by media and
communication networks to enrich personal and social development. However,
curriculum development and teacher training in media literacy continue to be
major challenges for the educational system. In Portugal, the ‘Media Education
Guidance for Kindergarten, Basic and Secondary Education’, approved by the
Ministry of Education in April 2014, may have been a milestone for implementing
media education at schools. Under this initiative of the Portuguese Ministry of
Education and under the European Project ‘e-MEL: e-Media Education Lab’, four
b-learning courses aimed at in-service teachers were promoted by the authors of
this paper in the 2015-2016 academic year. Approximately 130 teachers from
different educational areas and school grades attended these courses. This
paper presents the results of this training experience, discussing the
trainees’ expectations, the competencies they developed and the obstacles they
identified. It also aims to discuss the methodological principles and the types
of teacher training in media literacy. The article concludes by pointing out
the need for an educational policy that values teacher training, which could
contribute to a consistent implementation of media literacy in schools.
KEYWORDS: Media Education, Teachers, Training,
Curriculum, B-learning
1.-Introdução
Em 2014, ano de aprovação pelo Ministério
da Educação de Portugal do ‘Referencial de Educação para os Media para a Educação Pré-escolar, o
Ensino Básico e o Ensino Secundário’, um documento orientador para as escolas
portuguesas, tem início o projeto europeu ‘e-MEL - e-Media Education Lab’ que
contempla, na sua fase de experimentação, o desenvolvimento de cenários de
formação de professores em Educação para os Media.
Neste artigo, pretende-se apresentar resultados da análise de quatro cursos de formação, dois promovidos
por solicitação da Direção-Geral de Educação (DGE) e outros dois no âmbito do
projeto e-MEL e que envolveram cerca de 130 professores de distintas áreas
geográficas e de diferentes áreas e níveis de ensino do país. As expectativas,
as competências desenvolvidas, bem como as principais dificuldades
identificadas pelos formandos, são o foco principal de análise. Partindo desta
experiência de formação, pretende-se também discutir os princípios
metodológicos e as modalidades de formação em Literacia para os Media, especificamente a modalidade b-learning, e refletir sobre as
condições em que decorre atualmente a formação de professores.
O artigo começa com um ponto em que se
discute os desafios que os ambientes mediáticos e comunicacionais colocam às
escolas e aos professores e a necessidade de haver preparação para incorporar e
explorar com as crianças e jovens as experiências e práticas que decorrem da
sua relação com os media e as redes
digitais, enquanto consumidores e produtores de informação. As perspetivas
apresentadas nesta parte procuram explicar a importância e a urgência de
iniciativas de formação de professores, já reivindicadas pela Declaração de
Grünwald de 1992. A partir deste quadro, apresenta-se, no ponto 3, o contexto
em que decorreram os quatro cursos de formação contínua de professores, bem
como os temas e objetivos que os nortearam. Explica-se também a metodologia que
norteia este artigo. O ponto seguinte abre com uma caracterização dos
professores que participaram na formação, seguindo-se a apresentação dos
principais resultados provenientes dos questionários de diagnóstico e de
avaliação, aplicados no início e no fim do processo formativo. Por último,
discutem-se alguns dos resultados com maior destaque e desenham-se breves
recomendações que não deixam de ser um reforço de conclusões e de perspetivas
já anteriormente avançadas, mas ainda pouco concretizadas.
2. Novos ambientes mediáticos, escola e formação de profesores
2.1. Perspetivas gerais sobre a vertente formativa
Na era do Facebook, Instagram e Snapchat, o que significa educar
crianças e adolescentes? Como é que a escola tem em conta, no desenvolvimento
do currículo formativo, o novo ambiente informativo e comunicacional
configurado pela internet e pelas redes e plataformas digitais? Na verdade, no
último quarto de século, não foi apenas a paisagem tecnológica que mudou. Foram
também os processos de produção e de circulação da informação, as modalidades
de interação e de relacionamento, os referenciais e formas de criação e de
consumo culturais. A instituição escolar e o papel dos professores e educadores
não podiam e não podem deixar de ser questionados, neste novo contexto.
Numa perspetiva menos eufórica,
multiplicaram-se os mecanismos de controlo, os processos de vigilância, as
modalidades de fake news e propaganda
e as armadilhas à segurança individual. Ao mesmo tempo, e como chama a atenção
António Damásio no seu livro mais recente, o excesso e a velocidade da
informação, a “exaustão provocada pelo excesso de factos”, bem como o tempo e a
atenção desviados da “experiência imediata do ambiente que nos rodeia para uma
experiência mediada por uma grande variedade de dispositivos electrónicos”
(Damásio, 2017: 294-295) colocam novos desafios à comunicação entre as pessoas
e, necessariamente, aos contextos e processos de aprendizagem.
É perante este novo ambiente que se pode
dizer que um professor do século XXI não pode deixar de incorporar na sua
formação conhecimentos, competências e atitudes que o habilitem a lidar com as
gerações mais novas, mas também a construir-se como profissional e como pessoa
nesse novo quadro de vida.
O reconhecimento de que algum tipo de
Educação para os Media orientada para
a cidadania deveria estar presente na formação de professores vem de antes da
emergência e difusão do acesso à internet e à web É o caso da Declaração de
Grünwald sobre Educação para os Media.
Nela os especialistas da Unesco apelam aos responsáveis académicos e políticos
a que desenvolvam cursos de formação de docentes e outros agentes educativos
para “aumentar quer os seus conhecimentos e a compreensão dos media quer para os formar nos métodos de
ensino apropriados, tendo em conta o conhecimento (…)que muitos alunos já
possuem” (Unesco, 1982). Vinte e cinco anos depois, uma reunião internacional
realizada em Paris alertava para a conveniência de integrar a Educação para os Media na formação inicial de
professores, considerando essa componente “um elemento-chave do sistema”,
devendo incluir “dimensões teóricas e práticas” (Unesco, 2011).
Mais recentemente, esta preocupação leva a
Unesco a convocar peritos para aprofundar e sistematizar o assunto, já num
quadro novo desenvolvido ao longo da primeira década deste século, que procurou
cruzar a tradição da media education
com a information literacy e que
levou à proposta do conceito de media and
information literacy. Daí resultou um importante referencial que é um
currículo dirigido a professores , entretanto, traduzido em 10 línguas,
incluindo o espanhol e português. Nele se propõe uma visão holística que
conjuga diferentes vertentes: análise dos media
novos e clássicos; avaliação dos conteúdos mediáticos e das fontes de
informação; produção e uso dos media
e da informação. A orientação destas abordagens não pode perder de vista a
participação dos cidadãos nos processos democráticos e os direitos humanos.
Esta abordagem compreensiva e larga torna evidente que a formação de
professores na área dos media e da
informação não se confunde com o mero estudo dos media e menos ainda com a preparação docente no uso de tecnologias
digitais nos processos de ensino-aprendizagem. A par do eixo sociocultural e do
eixo textual, o eixo da tecnologia em lugar de meramente instrumental é, ele
também, objeto de análise, enquanto fenómeno socialmente construído. É nessa
direção que aponta também um dos documentos[1]
produzidos no quadro do e-MEL, projeto que constitui um dos contextos empíricos
analisados neste artigo.
As contribuições teóricas que abordam
criticamente a formação de professores, como as de Linda Darling-Hammond
(2010), sublinham aspetos que podem enquadrar a formação relacionada com os media e a informação e, por essa via,
inscrever esta última numa estratégia formativa mais ampla. Segundo esta autora
a formação de professores coloca em interação três vertentes de conhecimentos:
o conhecimento dos alunos e o seu desenvolvimento em contextos sociais
específicos; o conhecimento relacionado com a matéria /disciplina e com os
objetivos curriculares; e o conhecimento associado ao know how profissional (pedagogia, gestão, avaliação, etc). Por
outro lado, e como o processo formativo não é nem uma ilha nem uma mera
técnica, torna-se importante ter presente que é em função dos alunos que o
profissionalismo dos professores se exerce e que estes alunos são diferentes e
aprendem de modo e em ritmos diferenciados. Por outro lado, quer o ensino quer
a aprendizagem adquirem todo o seu sentido na medida em que promovem o
desenvolvimento dos alunos como pessoas e também como cidadãos capazes de se
inserir critica e ativamente no mundo envolvente, encontrando nesse exercício o
seu lugar e contributo específicos.
2.2. Iniciativas de
Educação para os Media no contexto
portugués
A Educação para os Media pode revestir-se de um significado saliente quer enquanto
dimensão ou inspiração das diferentes atividades curriculares, disciplinares ou
não, quer enquanto matéria com lugar e autonomia próprios no currículo e na
vida da escola. Correndo o risco de ser percecionada como secundária, ela é, no
entanto, uma dos domínios em que mais facilmente se pode instituir a
articulação entre o mundo da escola e a envolvente sociocultural e económica.
Tal depende em boa medida dos centros educativos e dos professores. Mas depende
naturalmente também das políticas educativas e das orientações curriculares.
Neste campo, importa notar que em Portugal
se assistiu, nas últimas duas décadas, a desenvolvimentos contraditórios, nos
quais se recortam as seguintes iniciativas:
. Um
primeiro dinamismo surgiu da iniciativa do Público,
um jornal diário de referência. Tratou-se de um projeto que visou aproximar os media da escola e da educação. Da sua
atividade, destacou-se um concurso nacional de jornais escolares que chegou a
ter perto de cinco centenas de participantes.
. Outra
experiência, esta oficial, tem sido, desde 1996, a da Rede de Bibliotecas
escolares (RBE), com uma presença em grande número de escolas e que tem sido um
espaço de inovação e de dinamização de diferentes literacias, entre as quais a
literacia mediática, com um saliente trabalho de formação de docentes. Cabe-lhe
assegurar, na escola, “o funcionamento e gestão das bibliotecas, as atividades
de articulação com o currículo, de desenvolvimento das literacias e de formação
de leitores”.
. Desde
2009, tem funcionado um assim designado Grupo Informal de Literacia dos Media (GILM), que reúne atualmente perto
de uma dezena de instituições públicas com competências e atividades
relacionadas de algum modo com os media
e a educação. Das iniciativas tomadas, destaca-se a realização bienal, desde
2011, de um congresso de literacia, media
e cidadania, que tem sido espaço e motor da constituição de uma rede de
professores, educadores e outros profissionais que intervêm nomeadamente em
contexto escolar.
. Este
grupo informal foi também o espaço onde germinou a ideia de um observatório de
Educação para os Media (MILObs –
Observatório de Media, Informação e Literacia) que, com o apoio do GILM, se
encontra em fase de arranque no Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade
(CECS) da Universidade do Minho.
. Também
a Direção Geral de Educação desenvolveu, na presente década, atividades de
Educação para os Media, como
recursos, encontros, parcerias, redes de escolas com meios de comunicação
escolares e iniciativas de formação de professores. É no seu âmbito que
funciona a já referida Rede de Bibliotecas Escolares bem como, em parceria com
o Ministério da Cultura, o Plano Nacional de Cinema que é “um programa de
literacia para o cinema e de divulgação de obras cinematográficas nacionais
junto do público escolar, garantindo instrumentos essenciais e leitura e
interpretação de obras cinematográficas junto dos alunos” [2].
. Merece
aqui referência a Recomendação sobre a Educação para a Literacia Mediática,
aprovada pelo Conselho Nacional de Educação, em 2011, na qual se defende uma
aposta que “garanta a formação (técnica e pedagógica) de professores,
responsáveis de bibliotecas e centros de recursos e outros agentes educativos”.
. A
Universidade do Minho, através do CECS, desenvolve desse há cerca de três
décadas formação inicial e contínua de professores, educadores e comunicadores,
bem como investigação científica centrada na Educação para os Media. Além do desenvolvimento do
projeto do Observatório MILObs, realizou, por solicitação da ERC- Entidade
Reguladora para a Comunicação Social, o estudo intitulado “Educação para os Media em Portugal - Experiências,
Actores e Contextos” (2011), bem como o já referido Referencial de Educação
para os Media, este em parceria com
Eduardo Jorge Madureira, do projeto Público na Escola [3].
. Foi
precisamente este Referencial, tal como a componente portuguesa do projeto
e-MEL, que pretextaram e enquadraram os cursos b-learning de formação, que são a base empírica do presente
artículo. O Referencial propõe guias de ação para a educação pré-escolar e os
níveis de escolaridade básica e secundária, quer numa perspetiva de
transversalidade do currículo quer de abordagens específicas – estas centradas
em temas e subtemas.
Todas estas iniciativas, com diferentes
proveniências e protagonistas, denotam uma preocupação de investimento na
formação de agentes educativos. No entanto, tem havido, segundo os dados
disponíveis, um retrocesso na oferta formativa a este nível, em Portugal. No
estudo realizado em 2011 para a ERC, as conclusões do levantamento feito no
país eram claras:
“O número de instituições de ensino
superior públicas e privadas que fazem uma aposta clara na área da Educação
para os Media é muito restrito (…).
Nas instituições superiores privadas a aposta na área é residual. Pode
afirmar-se que Portugal não assumiu, até ao momento, a Educação para os Media como uma aposta prioritária.”
(Pinto et al., 2011: 128). E ainda: “com a entrada em vigor da reforma de
Bolonha, pode afirmar-se que o panorama não melhorou, verificando-se mesmo que
a temática da Educação para os Media
perdeu terreno nas instituições de formação de professores” (id.: 129).
As razões são múltiplas, certamente, mas
uma delas, de consequências negativas, teve que ver com medidas de política
educativa que, para reforçar o peso de áreas tidas como sendo o core do currículo escolar, conduziram à
redução de matérias relacionadas com a educação para a cidadania e a literacia
mediática, considerando, em alguns casos, que a abordagem das TIC já respondia
a essa vertente (id.: 130).
Cabe aqui ressaltar que esta tendência que
se observou na formação de ensino superior viu-se reforçada com o impacto da
crise económica que afetou a segunda década deste século, com fortes restrições
orçamentais na formação de professores, incluindo na rede de centros de formação
contínua. Por outro lado, muitos pais das classes médias, preocupados com os
percursos escolares dos filhos e com o seu rendimento e classificações
escolares, são os primeiros, a pressionar os professores para não aderirem a
metodologias e experiências inovadoras.
Ou seja: o contexto de crescimento e de
aprofundamento de ações e programas de Educação para os Media depara com uma relativa paralisia do investimento da formação
de professores. As iniciativas nesta direção são pontuais e, em muitos casos,
assentes na autoformação dos docentes. É, assim, neste terreno, que se torna
necessário avaliar as poucas experiências feitas, cruzá-las com o percurso de
outros países, para, por esta via, responder às enormes necessidades
existentes.
3. O contexto da
formação e a recolha de dados
Este estudo tem por base quatro cursos
ministrados em 2016 a professores a exercer funções em escolas portuguesas em
vários níveis de ensino.
Dois cursos foram realizados no âmbito do
Projeto Europeu e-MEL – e-Media Education Lab, financiado pela União Europeia
ao abrigo do programa Erasmus +. Este projeto envolveu seis países (Bélgica –
Coordenação, Portugal, França, Reino Unido, Finlândia e Itália) e teve como
objetivo central desenvolver um centro inovador de recursos online para formar professores em
Educação para os Media [4].
Para chegar a este e-lab, a equipa
realizou um trabalho prévio de mapeamento de competências de literacia para os media dos professores [5],
nos países participantes, e desenvolveu e implementou cenários de formação [6]
(um total de 10) [7] em
literacia mediática dirigidos a professores da formação inicial e a professores
em exercício.
Os outros dois cursos foram realizados a
pedido da Direção-Geral de Educação (DGE) do Ministério de Educação (ME)
português. No seguimento da aprovação pelo ME, em abril de 2014, do Referencial
de Educação para os Media para a
Educação Pré-Escolar e o Ensino Básico e Secundário (Pereira, Pinto &
Madureira, 2014)[8],
estes cursos tiverem como principal objetivo promover a formação de formadores
tendo em vista a implementação do Referencial nas escolas. Na base estava o
propósito de formar formadores que pudessem replicar esta formação nos seus
contextos de trabalho, de forma a conseguir chegar a mais professores de
diferentes contextos geográficos. Foi com este intuito que a formação foi
dirigida a dois grupos: um das áreas de Lisboa e Sul e outro que abrangeu as
zonas Norte e Centro do país. A divulgação junto dos Centros de Formação e as
inscrições foram geridas pela DGE. No total, concluíram os cursos 130
professores.
Formação
DGE
|
Formação
e-MEL
|
|||||||
Cursos ministrados
|
CF1*
|
CF2*
|
CF1*
|
CF2**
|
||||
Duração
|
25h
|
25h
|
25h
|
25h
|
||||
Modalidade de formação
|
b-learning
|
b-learning
|
b-learning
|
b-learning
|
||||
N.º de formandos
|
31
|
35
|
27
|
37
|
||||
Forma de inscrição
|
Pela DGE
|
Pela DGE
|
Aberta
|
Aberta
|
* Compreender o Mundo Atual
** Usos dos media e audiências no ambiente digital
A formação teve por base a modalidade b-learning, ou seja, a combinação de sessões presenciais com sessões online, tendo cada curso decorrido ao longo de aproximadamente oito semanas. As primeiras e as últimas sessões, de um dia inteiro cada uma, foram presenciais. Esta interação direta foi essencial para o conhecimento mútuo de formandos e formadores e também para a avaliação da formação. As sessões online decorreram na plataforma Moodle, realizando-se a comunicação entre os formadores e os formandos através de Fóruns abertos em permanência para a partilha de informação e de recursos, bem como para o esclarecimento de dúvidas, e de outros Fóruns criados especificamente para o debate de alguns tópicos da formação. Teve também lugar a realização de sessões coletivas de conversação (chats), moderadores pelos formadores e com um guião definido previamente.
A formação teve por base a modalidade b-learning, ou seja, a combinação de sessões presenciais com sessões online, tendo cada curso decorrido ao longo de aproximadamente oito semanas. As primeiras e as últimas sessões, de um dia inteiro cada uma, foram presenciais. Esta interação direta foi essencial para o conhecimento mútuo de formandos e formadores e também para a avaliação da formação. As sessões online decorreram na plataforma Moodle, realizando-se a comunicação entre os formadores e os formandos através de Fóruns abertos em permanência para a partilha de informação e de recursos, bem como para o esclarecimento de dúvidas, e de outros Fóruns criados especificamente para o debate de alguns tópicos da formação. Teve também lugar a realização de sessões coletivas de conversação (chats), moderadores pelos formadores e com um guião definido previamente.
Como referido anteriormente, os cursos
tiveram como ponto de partida o Referencial de Educação para os Media do Ministério da Educação de
Portugal. Como tal, dos 12 temas de desenvolvimento apresentados neste
documento [9],
foram escolhidos dois para o desenvolvimento desta formação: o Tema 2 –
Compreender o Mundo Atual e o Tema 9 - Audiências, Públicos e Consumos. Na base
da escolha destes dois temas esteve a perceção dos formadores sobre a sua
pertinência nos tempos atuais: por um lado, a necessidade de se dar aos
professores ferramentas para explorar com os alunos o mundo em que vivem,
despertando-os para a leitura crítica da atualidade e para o modo como os media a apresentam e representam; por
outro, a necessidade de proporcionar aos formandos a compreensão das dinâmicas
de uso e de consumo dos diferentes media
e sobre os desafios, as ameaças e as oportunidades enfrentados por crianças e
jovens na nova paisagem mediática.
No âmbito do projeto e-MEL, foi solicitado aos formandos uma autoavaliação dos seus níveis de Literacia para os Media. No CF1, 13 consideraram esse nível baixo e 14 consideraram médio. De salientar que não houve nenhuma resposta em ‘muito baixo’ nem em ‘alto’. No CF2, 6 avaliaram o seu nível de Literacia Mediática como baixo, 27 como médio e 2 como alto. Esta aparente autoavaliação mais positiva poderá estar relacionada com a experiência relatada por este grupo ao nível da lecionação em Educação para os Media e no envolvimento em projetos neste domínio. Face a estes dados, compreende-se por que razão surge em primeiro lugar, ao nível das expectativas, o querer melhorar as competências de Literacia Mediática.
4.3. Avaliação da formação
Este artigo tem por base os questionários
de diagnóstico e de avaliação administrados aos formandos antes e depois da
formação. Embora os questionários da formação da DGE e do e-MEL tivessem uma
formulação diferente, em função do âmbito e dos objetivos da formação, eles
contemplavam algumas questões comuns que nos permitem uma análise de conjunto.
Quando esta não for aplicável, será feita uma leitura tendo por base o
respetivo grupo de formação.
Os dados dos questionários foram tratados
e analisados no programa de análise quantitativa SPSS.
4. Formação em
Educação para os Media: perceções e
expectativas de professores portugueses
4.1. Caracterização
dos formandos
Participaram nos quatro cursos de formação
contínua 130 professores, 66 nos cursos da DGE e 64 nos cursos do projeto
e-MEL, a lecionar em escolas públicas, desde o 1º ciclo do Ensino Básico até ao
Ensino Secundário [10].
Do total de professores, 88 eram do género feminino e 42 do género masculino.
Estes professores tinham uma média de 49 anos de idade e uma média de 24 anos
de serviço. Os formandos inscritos nos cursos do projeto e-MEL apresentavam uma
média de tempo de serviço ligeiramente mais baixa que os formandos dos outros
cursos, mas sempre acima dos 20 anos. Este dado aponta para professores já com
uma vasta experiência profissional ao nível do ensino. No que diz respeito às
áreas disciplinares, embora haja um leque diversificado de áreas, há um
predomínio das humanidades e das ciências sociais: 40 formandos eram
professores de língua materna (Português), 23 de línguas estrangeiras, 17 de
ciências sociais (História, Geografia), 10 eram professores bibliotecários. De
registar também 27 professores de ICT/Informática. Os outros formandos estavam
dispersos por outros áreas, como sejam, Educação Visual, Educação Moral e
Religiosa, Educação Física, entre outras. Seis professores lecionavam ao 1º
ciclo do ensino básico, sendo este um ensino interdisciplinar.
Deste grupo de professores, 87 referiram
ter alguma experiência na lecionação de Educação para os Media, contra 43 que mencionaram não ter essa experiência. O número
de professores que menciona ter esta experiência é consideravelmente maior no
grupo da DGE – um total de 61 – o que pode ter justificado a escolha para a
frequência destes cursos. Dos diferentes contextos em que esta experiência
ocorreu, salienta-se a sala de aula, seguindo-se as atividades
extracurriculares e, em terceiro, a biblioteca escolar. Perante o panorama que
é conhecido relativo à implementação da Educação para os Media nas escolas, este número não deixou de surpreender, pela
positiva, os formadores.
4.2. As expectativas dos professores em relação à formação
Os quatro grupos de formação apontaram como principais expectativas aspetos relacionados especificamente com a Literacia para os Media (LM), ou seja, com o âmbito e os objetivos da formação – melhorar competências, aceder a novos conteúdos e melhorar capacidade de ensinar LM. Melhorar capacidades de aprender online é apontada por um número reduzido de professores, o que se explica pela familiaridade da grande maioria com a formação online e especificamente com a plataforma Moodle, que é aquela que as escolas usam habitualmente. Os formandos da DGE foram também inquiridos sobre as suas expectativa em conhecer e saber como aplicar o Referencial de Educação para os Media, tendo este item recebido um número razoável de respostas (48).
4.2. As expectativas dos professores em relação à formação
Os quatro grupos de formação apontaram como principais expectativas aspetos relacionados especificamente com a Literacia para os Media (LM), ou seja, com o âmbito e os objetivos da formação – melhorar competências, aceder a novos conteúdos e melhorar capacidade de ensinar LM. Melhorar capacidades de aprender online é apontada por um número reduzido de professores, o que se explica pela familiaridade da grande maioria com a formação online e especificamente com a plataforma Moodle, que é aquela que as escolas usam habitualmente. Os formandos da DGE foram também inquiridos sobre as suas expectativa em conhecer e saber como aplicar o Referencial de Educação para os Media, tendo este item recebido um número razoável de respostas (48).
Gráfico 1 – Expectativas dos professores em relação à formação – CF1 e
CF2 do e-MEL e da DGE
No âmbito do projeto e-MEL, foi solicitado aos formandos uma autoavaliação dos seus níveis de Literacia para os Media. No CF1, 13 consideraram esse nível baixo e 14 consideraram médio. De salientar que não houve nenhuma resposta em ‘muito baixo’ nem em ‘alto’. No CF2, 6 avaliaram o seu nível de Literacia Mediática como baixo, 27 como médio e 2 como alto. Esta aparente autoavaliação mais positiva poderá estar relacionada com a experiência relatada por este grupo ao nível da lecionação em Educação para os Media e no envolvimento em projetos neste domínio. Face a estes dados, compreende-se por que razão surge em primeiro lugar, ao nível das expectativas, o querer melhorar as competências de Literacia Mediática.
No que diz respeito às competências que
esperavam desenvolver, a de análise dos media
surge com algum destaque nos quatro grupos. Os formandos da DGE destacam de
seguida as competências de produção mediática, enquanto os do projeto e-MEL
salientam as competências pedagógicas, uma diferença que se pode explicar pela
maior experiência expressa pelos professores dos grupos da DGE ao nível da
lecionação em Educação para os Media. As capacidades técnicas recolheram neste
conjunto menos respostas, mesmo assim, 48 professores esperavam desenvolver
esse tipo de capacidades durante a formação. Dado que, com frequência, a
Literacia para os Media é entendida
pela vertente do acesso e do manuseio técnico das tecnologias e do seu uso como
recurso para a aprendizagem, era importante saber se estas eram as principais
razões que tinham guiado os professores até à formação. Também a este nível, as
expectativas dos formandos foram de encontro ao que se encontrava delineado
para os quatro curso de formação, centrados primeiramente na análise e
compreensão crítica dos media e na
transposição destas capacidades para o contexto educativo.
Gráfico 2 –
Competências que os professores esperam desenvolver na formação – CF1 e CF2 do
e-MEL e DGE
No questionário de diagnóstico, procurou-se saber que eventuais obstáculos os professores poderiam antever para o percurso da formação. O Gráfico 3 resume esses obstáculos. Destaca-se o facto de 99 professores não conseguirem, naquela altura, especificar qualquer obstáculo, embora os dois problemas que foram identificados logo no início da formação venham a ser os mais expressivos quer no decorrer das sessões, quer no momento da avaliação. Com efeito, estes aspetos foram tão destacados no final da avaliação que levaram os formadores a questionarem se o grau de exigência e o número de tarefas estariam adequados à duração dos cursos. Os formandos eram, na sua maioria, experientes neste tipo de formação, sendo alguns deles já formadores, sobretudo os que frequentaram os cursos da DGE. Ou seja, não estávamos perante grupos inexperientes neste domínio, sendo por isso um aspeto que merece alguma reflexão e a que voltaremos nas considerações finais.
Gráfico 3:
Possíveis obstáculos no envolvimento nas atividades da formação – CF1 e CF2 do
e-MEL e DGE
Centremos agora a atenção no período pós-formação, detendo-nos sobre a avaliação realizada pelos formandos. De um modo geral, a formação foi bem recebida e bem avaliada pelos formandos quer do projeto e-MEL quer da Direção Geral de Educação. Embora a média relativa ao item ‘o curso foi fácil’ não atinja em nenhum grupo os quatro pontos, as médias dos restantes itens situam-se sempre acima desse valor, o que revela um nível muito razoável de satisfação com a formação e com a sua aplicabilidade no contexto profissional, como mostram os Gráficos 4 e 5. Com efeito, são de salientar os valores alcançados nas respostas relativas à utilidade das competências desenvolvidas para a vida profissional e à expectativa de a aplicar esta formação nos respetivos contextos de trabalho, sendo este um dos objetivos centrais dos cursos ministrados no âmbito da DGE.
Os grupos da formação do projeto e-MEL apontaram como atividades mais interessantes o trabalho desenvolvido em grupo, a par da exploração de recursos, seguida da formação presencial e dos exercícios de análise dos media. Como menos interessantes e como mais difíceis, aparecem destacadas as discussões em fóruns/chats, um aspeto que ao longo da formação se foi revelando como problemático, dadas as limitações da ferramenta proporcionada pela plataforma Moodle e a dificuldade, por parte dos formadores, em moderar um enorme fluxo de conversa. Um vez identificado este problema, os formadores adotaram diferentes estratégias para procurar minimizá-lo, desde a divisão do grande grupo em subgrupos, à elaboração de um guião de conversa, à definição de uma ordem pela qual os subgrupos deveriam apresentar as suas ideias e os seus trabalhos, mas a discussão síncrona online acabou por não alcançar um nível satisfatório, quer para formadores, quer para formandos. Este foi também o ponto mais fraco apontado pelos formandos da DGE ao nível das atividades desenvolvidas durante a formação. Como atividades mais interessantes foram indicadas a leitura dos textos propostos, a realização das atividades e a exploração de recursos, como por exemplo, vídeos e meios de comunicação online. Não deixa de ser interessante verificar que a interação com colegas é assumida por alguns formandos do curso da DGE de Lisboa como uma atividade difícil, não se registando a mesma opinião nos formandos do curso do Porto/Norte, o que talvez possa ser explicado pela interação que o trabalho de grupo proposto a este grupo acabou por fomentar.
Gráfico 4 –
Avaliação do curso pelos formandos do CF1 do e-MEL e DGE (Escala de 1 a 5
valores, sendo 1= Discordo Totalmente e 5= Concordo Totalmente)
Gráfico 5 –
Avaliação do curso pelos formandos do CF2 do e-MEL e DGE (Escala de 1 a 5
valores, sendo 1= Discordo Totalmente e 5= Concordo Totalmente)
Ainda a nível dos grupos da DGE, é
possível verificar se a formação permitiu responder às expectativas formuladas
no início do processo formativo e se correspondeu em termos de competências
desenvolvidas. No que diz respeito às expectativas, pode-se considerar que, de
um modo geral, a formação respondeu positivamente ao que os professores
delinearam no questionário inicial, embora não em todos os aspetos (Gráfico 6).
O CF1 identifica como as principais expectativas alcançadas ‘ter uma noção do Referencial de Educação para os Media e como aplicá-lo’, ‘melhorar as competências em literacia mediática’ e, com o mesmo número de respostas, ‘aceder a novos conteúdos para fazer formação em Literacia Mediática’ e ‘melhorar a capacidade de lecionar Educação para os Media’. No que diz respeito ao CF2, as expectativas que obtiveram mais respostas são as mesmas, apenas mudando de posição alguns itens. Destes resultados, importa salientar o facto de a formação ter ido ao encontro das expectativas formuladas no início da formação. Embora não seja possível fazer esta afirmação para a totalidade dos formandos, nem seja possível estabelecer correspondência em cada caso individualmente considerado, pode-se no entanto tomar como garantida a satisfação das expectativas de um número significativo de formandos no que diz respeito aos quatro itens apontados anteriormente e que correspondem aos principais objetivos traçados para a formação. O mesmo não se verificou ao nível do melhorar a capacidade para ensinar e aprender online. Por um lado, a maioria dos formandos era já experiente neste tipo de ensino-aprendizagem online, sendo de admitir que os cursos não estavam voltados para esses objetivos.
Gráfico 6 – Expectativas que os formandos consideram ter
atingido – CF1 e CF2 da DGE
Relativamente às competências
desenvolvidas, sem dúvida que a de análise dos media é a mais apontada pelos formandos da DGE, quer do CF1 quer do
CF2. Alguns formandos destes dois cursos (27) apontam também as competências
pedagógicas. As competências de produção mediática parecem ter sido menos
desenvolvidas, embora no questionário inicial também não aparecessem com um
índice elevado de expectativas. Este deverá ser, contudo, um aspeto a que se
deve que prestar mais atenção em futuras formações, dada a importância que a
criação e produção de mensagens assume hoje no ambiente mediático.
A terminar, mas situando-nos ainda ao
nível da avaliação da formação, valerá a pena citar alguns formandos,
reproduzindo as avaliações que deixaram no campo das questões abertas do
questionário. Sobre estas afirmações, e sobre a análise que fizemos sobre os
dados aqui apresentados, teceremos algumas considerações no ponto seguinte.
Excelente.
Imprescindível, pertinente, adequado. Uma mais-valia na orientação profissional
futura. (CF1 e-MEL).
O curso
tem bastante qualidade, pois alertou-me para questões fundamentais relacionadas
com os media e será de extrema utilidade
para o meu papel de professor e bibliotecário. (CF1 e-MEL).
Foi um
bom curso, útil e interessante, com aplicabilidade na prática profissional. O
ponto alto, no meu ponto de vista, foi o contacto com novos recursos e a
partilha de experiências entre colegas. (CF2 e-MEL).
Aquisição
da consciência sobre a relevância da integração de conceitos de Educação para
os Media no currículo escolar. (CF1 DGE).
Falta
de um acompanhamento mais próximo e frequente na realização das atividades e do
respetivo feedback. (CF1 DGE).
A
reflexão proporcionada sobre a Educação para os Media e a forma como estes
influenciam a visão do mundo. Esta reflexão e aprendizagem será útil quer no
âmbito pessoal, quer no âmbito profissional. (CF2 DGE).
A
consciencialização da importância que a Educação para os Media tem nas crianças
e jovens e como tão pouco ou nada se trabalha sobre isto nas escolas com eles.
(CF2 DGE).
5. Discussão e
Considerações Finais
Como tem sido continuamente repetido por
vários autores, para que a Literacia para os Media possa assumir o seu lugar e conquistar importância em
contexto escolar, é necessário apostar na formação inicial e contínua de
professores. É necessária uma política que favoreça a sua integração curricular
e em projetos de escola, indo além das ações e iniciativas pontuais que vivem
muito da militância dos agentes educativos. Em Portugal, como vimos atrás, o
Conselho Nacional de Educação, a instância oficial mais representativa dos
agentes educativos, recomendou em 2011, a aposta na “formação de professores em
educação para a literacia mediática”. A publicação, em 2014, do Referencial de
Educação para os Media (Pereira,
Pinto & Madureira, 2014) foi um passo em frente na definição de uma
política de integração e de implementação da Literacia para os Media no ensino, desde o pré-escolar até
ao ensino secundário. O documento é orientador do trabalho a desenvolver nestes
níveis de ensino, mas não retira a necessidade de uma política e de planos de
formação de professores. Pelo contrário. Foi neste âmbito que foram
desenvolvidos dois dos cursos de formação apresentados anteriormente. Os outros
cursos foram desenvolvidos no quadro de um projeto europeu que parte também do princípio
da necessidade formar professores para tornar viável a implementação da
Educação para os Media em terreno
escolar.
Com o processo de Bolonha, que ditou a
reorganização do sistema de ensino superior, áreas como a literacia mediática
ficaram reduzidas ou desapareceram dos currículos da formação inicial de
educadores e professores. Não obstante as recomendações europeias e nacionais,
não houve progressos ao nível da integração curricular desta área. Ao nível dos
currículos dos vários níveis de ensino em Portugal, a Literacia Mediática surge
a par de outras catorze áreas temáticas, cabendo ao professor a escolha da área
ou áreas a abordar com os alunos.
Perante um quadro de ausência de formação
neste domínio ao nível da formação inicial, a aposta parece ter de recair na
formação contínua, embora a austeridade económica que o país atravessou, e
continua a atravessar, tenha afetado a oferta e a procura de formação,
sobretudo de formação paga. O desenvolvimento tecnológico e as mudanças na
paisagem mediática e nos padrões de consumo dos media constituem-se, no entanto, como condições favoráveis ao
desenvolvimento de competências que permitam o uso crítico, responsável e
criativo dos media e que fomentem a
expressão de ideias, a produção e a participação cívica. O interesse
demonstrado pelos professores na oferta dos cursos de formação aqui
apresentados, bem como a avaliação final desses cursos, apontam para a existência,
hoje, de uma maior sensibilização e consciência públicas face ao ambiente
simbólico criado pelo digital e para a necessidade de estas matérias não
ficarem do lado de fora dos muros da escola.
Este interesse foi bastante visível no
percurso da formação e confirmado pelos resultados da avaliação. A
heterogeneidade dos grupos e a diversidade dos interesses e necessidades dos
formandos permitiu-nos identificar um conjunto de oportunidades e de
dificuldades em relação à formação e ao quadro em que se desenvolveu. São
alguns destes aspetos que pretendemos discutir nos pontos seguintes, à luz dos
dados apresentados anteriormente.
- De
um modo geral, os resultados da formação foram bastante satisfatórios, tendo
contribuído para a concretização do Referencial de Educação para os Media;
- O
ponto de partida dos formandos em relação à área era muito desigual, o que
exigiu um trabalho inicial de clarificação de conceitos e de sensibilização
para um trabalho a este nível nas escolas;
- Estes
aspetos propedêuticos poderiam ser tomados como adquiridos caso houvesse uma
maior continuidade na formação, o que permitiria passar a um nível mais
avançado da formação;
- Nesta
primeira abordagem, os formadores apostaram em duas das vertentes temáticas do
Referencial – uma mais centrada nas questões do jornalismo e da atualidade,
tendo como propósito explorar os modos como se conhece o mundo e o papel dos media nessa leitura e uma outra mais
focada nas audiências e nos públicos e nos seus usos e práticas mediáticas. No
caso dos cursos do projeto e-MEL, tanto no momento da inscrição como durante a
formação, esta segunda vertente captou mais interesse e mais atenção por parte
dos formandos, talvez pelos tópicos da formação e pela sua maior familiaridade
com a segunda dimensão;
- As
ações decorreram num contexto que dificulta os objetivos: o trabalho sobre
Educação para os Media nas escolas é
ainda incipiente ou mesmo inexistente, confundindo-se frequentemente media com tecnologia;
- O
clima existente em muitas escolas, centrado mais nos resultados do que nos
processos, de hipervalorização dos Exames e do cumprimento dos programas
escolares, retira da escola e das salas de aula a abordagem de aspetos que
fazem parte da vida dos estudantes mas que não são considerados centrais ou relevantes
para o processo de ensino e para a formação socio-pessoal das crianças e
adolescentes. Também as modalidades de trabalho que envolvem a participação dos
alunos levantaram vários problemas em alguns casos;
- Com
esta formação verificou-se o que era expectável: o que se vai fazendo no quadro
da Educação para os Media é bastante
tributário da dinâmica da Rede de Bibliotecas Escolares, ou seja, do trabalho
que os professores bibliotecários desenvolvem no contexto da biblioteca
escolar;
- A
escassez de recursos que os professores possam tomar como apoio continua a ser
notada, apesar da facilidade e do maior livre acesso à informação que a Web
permitiu. Este tem sido aliás um problema recorrente, identificado em vários
outros contextos de formação e de investigação[11]
(Pereira, Pinto & Pereira, 2012);
- O
programa dos cursos acabou por ser ambicioso e o número de horas insuficiente.
Os formandos foram unânimes quanto a estes dois aspetos, opinião que é também
partilhada pelos formadores;
- A
modalidade escolhida para a ministração dos quatro cursos – b-learning – revelou-se bastante
adequada e permitiu reunir, no caso dos grupos do e-MEL, professores de
diferentes áreas geográficas, de norte a sul do país, situação que teria sido
impossível se a formação fosse unicamente presencial. O b-learning proporcionou aos formandos uma maior autonomia na gestão
da formação e da sua aprendizagem, o que foi também uma mais-valia. Contudo,
houve também aspetos negativos a registar: a dificuldade dos formadores em
acompanhar e dar resposta a todos os comentários que os formandos iam deixando
na plataforma; o silêncio por parte de alguns formandos e a dificuldade de os
motivar a interagir; o funcionamento um pouco caótico das sessões síncronas
usando o chat disponível no Moodle – este foi aliás o aspeto
negativo mais vezes mencionado pelos formandos e que recebe a concordância dos
formadores. Apesar das diferentes estratégias usadas, foi impossível chegar a
um modo de conversação síncrona satisfatório. Chat com grupos grandes gerava confusão e dificuldade em acompanhar
o que ia sendo escrito; por sua vez, chats
com grupos pequenos criava muitos tempos de silêncio e dificuldade em animar a
discussão. O recurso a outro tipo de meio de comunicação, com e entre os
formandos, poderia ter sido uma boa solução para corrigir estes problemas. As
sessões presenciais que abriram e fecharam os cursos foram essenciais para o
conhecimento do grupo, na medida em que permitiu ligar nomes a rostos e pessoas
concretas, tendo ajudado a criar um clima de maior proximidade entre todos os
participantes. Quando os grupos não têm membros dispersos geograficamente, a
experiência desta formação aconselha a realização de mais sessões presenciais,
algo que foi também reclamado por alguns formandos na avaliação;
- Por
último, um aspeto que parece essencial e central a todo este trabalho: é
necessária uma política consistente de formação de professores, e não apenas na
área da Literacia para os Media. Esta
questão não pode ficar apenas dependente da iniciativa dos docentes e do seu
esforço de autovalorização; é imprescindível uma política educativa que
valorize efetivamente a formação e que, ao fazê-lo, crie condições de espaço e
de tempo favoráveis, no quadro do exercício da profissão, e com vantagens na
progressão para todos aqueles que nela investem. Apostar numa política
consistente de formação de professores, nomeadamente na vertente da Educação
para os Media, é também uma forma de
investir na qualidade e inovação no ensino-aprendizagem, na qualidade e
motivação do corpo docente e - razão de ser da escola e da educação – no
desenvolvimento e capacitação das “pessoas que moram nos alunos” (Azevedo,
2000).
Reconhecimento
Uma parte deste artigo é desenvolvida no
âmbito do Projeto Europeu eMEL – e-Media
Education Lab, cofinanciado pela União Europeia no quadro do programa
Erasmus+.
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Unesdoc http://unesdoc.unesco.org/images/0019/001929/192971e.pdf
[1]
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Project.
http://e-mediaeducationlab.eu/en/for-teachers-trainers-in-media-literacy/
(acesso em 5.10.2017)
[2] Ver http://www.dge.mec.pt/plano-nacional-de-cinema [acesso em 25.10.2017]
[3] Ver http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/30320/1/referencial_educacao_media_2014.pdf [Acesso em 17.09.2017]
[5]
Um tutorial sobre Competences Evaluation
está disponível aqui:
http://e-mediaeducationlab.eu/wp-content/uploads/2017/04/B_Competencesevaluation_IHECS.pdf
[6] Designação adotada no âmbito do
projeto, equivalente a cursos de formação, mas que pretendia destacar o
contexto em que se desenrolava a formação, bem como os seus atores.
[7] Os cenários de formação podem
ser consultados aqui: http://e-mediaeducationlab.eu/en/10-training-resources/
[8] O Referencial pode ser descarregado aqui: http://www.dge.mec.pt/educacao-para-os-media (versão em língua portuguesa e em língua inglesa).
[9]
No Referencial propõe-se o tratamento progressivo, desde a educação pré-escolar
até aos ensinos básico e secundário, de um conjunto de 12 temas, a saber: 1.
Comunicar e informar; 2. Compreender o mundo atual; 3. Tipos de media; 4. As TIC e os ecrãs; 5. As redes
digitais; 6. Entretenimento e espetáculo; 7. Publicidade e marcas; 8. Produção
e indústria/profissionais e empresas; 9. Audiências, públicos e consumos; 10.
Liberdade e ética, direitos e deveres; 11. Os media como construção social; 12. Nós e os media.
[10]
Em Portugal, a escolaridade obrigatória é de 12 anos. As crianças entram para o
1º ano do Ensino Básico quando completam 6 anos de idade e terminam o seu
percurso escolar aos 17/18 anos, ao concluir o 12º ano, o último ano do Ensino
Secundário.
[11] Como forma de contribuir para
colmatar esta lacuna, em 2009 o projeto ‘Media Education in Booklets’,
financiado pela Evens Foundation (Bélgica), deu origem à produção de três booklets sobre Televisão, Internet e
Videojogos, disponíveis aqui: http://www.lasics.uminho.pt/edumedia/?page_id=69.
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